Diverti-me imenso ontem ao assistir ao magnífico espectáculo de variedades que foi a edição do Prós e Contras. Então não é que o refinadíssimo Carrilho, armado em bárbaro Kalimero, vem agora levantar o véu da tenebrosa cortina conspirativa que faz e desfaz personagens da Nomenklatura. Há muito habituado a um regime dietético que lhe permitia levitar sobre o incomensurável mar dos mortais ordinários, o marido da bárbara, esqueceu-se que quando se mete demasiada gente na cama o lençol não tapa tudo; se se puxa para a cabeça destapam-se os pés...
Mas é agradável ver estas impertinentes e arrogantes personagens que tanto manipularam a Kultur em Portugal fazerem agora o papel de chorões queixinhas. Tanto foi o fel que algum respingou...
E apontam o dedo ao conluio dos media. É verdade que quando não buscam nos instintos mais rasteiros a fórmula eficaz para captar as audiências, os senhores que controlam os media injectam-nos com informação e espectáculo que pouco têm que ver com as referências culturais intrínsecas da nossa gente. Há muito que se deixou de fazer a promoção da língua e da literatura, da cultura popular, da música erudita e tradicional, etc.. E, das poucas vezes que o tentam, fazem-no quase sempre de forma politicamente polarizada, tratando esses âmbitos culturais mais como um instrumento de captação ou marcação ideológica do que como um fim em si mesmo. A promoção da Kultur é uma permanente feira de vaidades, onde só um bem delimitado conjunto tem entrada. Procurando aguentar-se em circuito fechado, tentam passar a ideia da maior abertura de espírito e tolerância não prescindindo de convidar, por vezes, um ou outro outsider, porventura mais sequioso de visibilidade pública ou de consideração social, como forma de iludir a imagem fortemente restrita do círculo. No sistema político, as formações partidárias agrupadas por matrizes ideológicas de há muito que cederam lugar às plataformas formadas pelo menor denominador comum dos interesses individuais ou de grupos limitados. Os partidos, nomeadamente os que configuram o balancé do Poder, são muitas vezes doutrinariamente intermutáveis, partilhando basicamente as mesmas ideias e orientações, apenas se distinguindo pelas cores clubistas, por um diferente património de memória histórica e, sobretudo, por distintas agregações de grupos de interesse. Tendo por referência a característica imobilidade burguesa dos Blocos Centrais, tendem a estratificar uma Liga de Poder estanque em que pontificam o clientelismo e o caciquismo, bloqueando qualquer iniciativa ou movimento que possa pôr em causa as regras do jogo, em particular, e o status quo, em geral.
Também se tornam cada vez mais evidentes, as abstrusas ligações entre altos responsáveis do Estado e alguns lobbies capazes de movimentar grandes quantidades de dinheiro como o são a construção civil, os fabricantes e distribuidores de medicamentos, os negociantes de armamento, o mundo do desporto profissional, algumas enigmáticas e pseudo-filantrópicas sociedades e Fundações, etc.. As relações entre estes grupos evoluem geralmente em espiral, aumentando o seu Poder potencial através da simples regra do coça as minhas costas que eu coçarei as tuas. E, amiúde, quer o mundo do espectáculo quer o da comunicação social, muitas vezes propriedade sua, ou sob o seu controlo, são usados para denunciar ou para esconder, para desgastar ou promover, para condenar ou incensar os adversários ou os membros afectos ao círculo, respectivamente.
Ao querer despudoradamente promover-se através dos fotogénicos argumentos da mulher, Carrilho esticou o lençol e destapou as partes...que se revelaram insignificantes e vulneráveis à ironia e à crítica.
terça-feira, maio 23, 2006
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1 comentário:
Certo, certíssimo. " ao querer despudoradamente promover-se através dos fotogénicos argumentos da mulher..."!
Vi o programa e pergunto-me: para que serve Carrilho? Que utilidade pode ter para a Causa? Nobilitá-lo em Visconde de Bárbara a troco de escaqueirar a nomenclatura!?
Ele há-de servir para alguma coisa...
Parabéns pelo texto.
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