Motivou-me o texto do FGSAntosa postar (ou se calhar repostar)uns fragmentos sobre o tema do nacionalismo, nomeadamente sobre algumas ameaças à identidade nacional, nomeadamente os de alguns disparatados zelotas.
Apesar destas complexas dimensões, há, na realidade, duas weltanschauung ou mundovisões base que há muito se digladiam. Entendem uns que o papel do Homem é ser senhor do seu próprio destino, de modo a contribuir para oferecer à humanidade o bem estar físico através da conquista do mundo material, sem necessidade de qualquer força, anseio ou poder espiritual, no que reputam de obscurantismo. Recusam aceitar a interferência da fé e do sobrenatural pretendendo demonstrar tudo através da razão. Outros concebem os humanos como filhos de Deus, abandonados à gestão do mundo material, em que se devem guiar pelo amor ao próximo e a si mesmo, praticando as virtudes espirituais da fé, da esperança e da caridade. Acreditam numa dimensão sagrada da vida pelo que, para eles, os outros fundam a sua lógica numa admiração egoísta pelo Eu pessoal; mesmo que entre eles existam almas generosas, a maioria apenas espera obter benefícios pessoais, trabalhando por apetite à recompensa terrena.
No desenrolar desse conflito permanente, a Igreja Católica foi especialmente fustigada e causticada, mormente nos últimos séculos. A semente dessa perseguição pode encontrar-se já nos próprios movimentos da Reforma pós-humanista, no século XVI. Por permanente radicalização e refinamento, as ideias por eles engendradas vieram a incubar no século XVII, germinaram no século XVIII, desenvolveram-se no XIX, atingindo, finalmente, a maturação no século XX. Hoje, é notório que alguns sectores da Igreja, no remanso aparentemente protegido das sociedades do pós-guerra, rapidamente perdoaram e esqueceram as depredações, as humilhações e os seus mártires. Prenhes de benevolência e de misericórdia, de convencimento de conversão e de tolerância, trataram mesmo de proteger e acoitar os seus perseguidores de outrora. Talvez tenha também contribuído para isso a eterna tentação de abraçar o Filho Pródigo que leva a que, por vezes, se honre e acarinhe mais o inimigo de Deus que o próprio crente. No entanto, superando essas parciais inclinações, a portentosa figura de João Paulo II procurou sobrepor-se às tentações positivistas e de pretenso aggiornamento de alguma hierarquia eclesiástica demonstrando, pelo exemplo, pela abnegação e pela humildade, o caminho para a Concórdia, a Justiça e a Paz no Mundo.
Contudo, no meio dessa agitada dinâmica de afirmação espiritual, importa não perder de vista, como ameaça à Identidade Nacional, a acção pró-internacionalista de grupos religiosos, católicos, islâmicos, etc., que, demasiado embrenhados na sua militância, esquecem facilmente as referências axiais pátrias. Com a obediência interna a sobrepor-se à humildade, a auto-estima à caridade e a sobranceria à piedade transformam-se rapidamente em grupos virados para si próprios, de confrangedora atracção centrípeta, uniformizadora e tendencialmente auto-sustentada. Manifestam preocupação pelos Outros, em abstracto, mas quanto ao amor ao Próximo, concreto e imediato, ignoram ou passam ao lado. Com um tipo de caracterização que faz lembrar as seitas, e onde não falta por regra um guru, confundem abstrusamente os planos do religioso e do político, manifestando tendência para um comportamento que poderíamos designar por autismo social. E, como sempre acontece nestas organizações, os neófitos são os mais atentos zelotas quais cães de guarda que auxiliam o pastor na condução do rebanho. O seu caminho é, geralmente, considerado o mais válido quando não o único para atingir a pertença ao Povo universal. Para eles, toda a realidade e construção colectiva da Nação está abaixo do internacionalismo religioso a que importa obedecer em nome de Deus. Afirmam que a Nação é História enquanto que Deus é Eterno e, como tal, a escolha e hierarquização das relações de pertença são fáceis de definir. São versões modernas das muitas falácias teocráticas que ao longo dos tempos foram surgindo e que se esquecem amiúde do significado da expressão: a César o que é de César...
quarta-feira, março 01, 2006
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