Li com gosto um artigo do meu querido amigo Zé Miguel no segundo número da bem retornada revista Mama Sume. Com a clarividência que o caracteriza, Júdice elenca as três principais razões que, em seu entender, levaram ao sucesso do 25 de Novembro, a saber: os Comandos e os seus convocados, o escapulir do PC e a atitude dos militares auto intitulados moderados (Costa Gomes?, Pezarat?, Charais? moderados?)
Eanes costuma dar mais ou menos a mesma explicação, variando porventura a hierarquia, em importância, dos argumentos. Zé Miguel, quiçá por falta de espaço (ou de tempo) não explica a situação sócio-política do país que esteve seguramente subjacente às leituras que levaram àquelas posições. Como Eanes, ignora (ou, pelo menos, não menciona) a revolta popular que grassava em largas zonas de Portugal, em parte estimulada pelo trabalho de organizações com que ele colaborava.
Por outro lado, não posso deixar de lembrar que o que se seguiu ao 25 de Novembro não foi mais que o velho equívoco da paz podre que degenera sempre num golem centralão. À direita e à extrema esquerda foi dada ordem para rebaixar a voz, e do PS e do partido irmão-alternativo saíu a nomenklatura que até hoje tem governado, em cículo fechado iniciático, este pobre país. O desmembramento, intitulado eufemisticamente descolonização, estava concluído no essencial, pelo que Portugal e os seus lameiros podiam ser deixados ao governo dos feitores e caseiros indígenas. Quanto mais dóceis mais mamariam... O PC continuou instalado nas empresas públicas, de onde nunca foi desalojado, e o PS iniciou a conquista do aparelho da administração pública. Entre conversões e aggiornamenti gente daqui e d'acolá foi-se juntando ao festim, calcando sobre os pés verdades, liberdades e qualidades. A Kulturkampf deixou de existir por falta de comparência de um dos adversários, aprisonado em casa sob chantagem e promessas vãs.
Pois é, ele há coisas que são o que são...
segunda-feira, março 27, 2006
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3 comentários:
100% de acordo; o trabalhinho do desmantelamento tinha sido concluído dias antes (salvo talvez Timor, que se tem ido parar às mãos de um ditador comunista nunca mais se tinha ouvido falar dele, estava mais ou menos como o Tibete), o país podia voltar às mãos do caciquismo, feito o frete por aqueles patetas descartáveis, com ou sem monóculo, com ou sem patilhas.
Mas estou convencido de que também houve a consciência de que já se tinha ido longe de mais, já não era possível uma tomada final de poder pelos sublevados da esquerda através de mero putsch, assim a jeitos de Vilafrancada, porque o povo acima de Rio Maior já andava em defenestrações, um prelúdio a uma Guerra Civil de grande escala. Um dia disseram-me que o chamamento de distress passou a ser Mayday porque se tinha vulgarizado uma interpretação menos lisonjeira para SOS (same old shit). Aplica-se, não achas? Olhando para o centralão, apetece acrescentar SOS, com e sem ponto de exclamação.
«O PC continuou instalado nas empresas públicas (...)». E instalou-se em dezenas de autarquias, o que lhe serviu para se acomodar ao sistema.
E a consciência, que evoca o Jansenista, de que já não se conseguia ir mais longe, mas, ao mesmo tempo, a principal função cometida ao PC por Moscovo - descolonizar - estava cumprida, ajudou a acalmar as águas vermelhas.
Deixei-te uma lembrancinha lá no blogue, mas não vás sem teres uns lenços preparados!
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